A equipa da Agenda dos Açores decidiu entrevistar Nuno Costa Santos, responsável pela direcção deste projecto da editora Letras Lavadas. Para o escritor “a Grotta pretende situar-se entre a tradição e a experimentação, entre a atenção merecida a vozes afirmadas e a vontade de dar lugar a diferentes escritas e outras artes”.
1. O terceiro número da revista grotta — arquipélago de escritores homenageia o poeta e escritor Emanuel Jorge Botelho não só com uma entrevista feita por si e por João Pedro Porto, como também através da tradução para inglês de alguns dos seus poemas e textos. Esta homenagem é como que uma continuação da homenagem a ele prestada no evento Arquipélago de Escritores?
É, sim. A entrevista a Emanuel Jorge Botelho é uma homenagem porque, através das respostas do autor, podemos – público que o conhece, público que o quer visitar – perceber qual é a sua ética literária, qual a razão pela qual escreve, quais os seus temas recorrentes, o que pensa hoje do mundo. Pretende ser um carreiro que todos podem percorrer para se aproximarem do autor e da pessoa. A tradução de alguns poemas, escolhidos por Manuel de Freitas, poeta e editor, para inglês, feita, generosamente, por Kathleen Mundell Calado, acontece porque o Encontro Arquipélago de Escritores pretende fazer dialogar diferentes línguas. Achámos que a poesia de Emanuel Jorge Botelho iria ganhar outra tonalidade em inglês e avançámos para a ideia. A ligação foi feita pela Leonor Sampaio da Silva, que faz parte da comissão consultiva do Arquipélago de Escritores. São tudo formas de celebrar Emanuel Jorge Botelho e a sua escrita.
2. Continuando com as homenagens, estas parecem ser o foco desta edição da grotta, pois muitos foram os homenageados, como o já citado Emanuel Jorge Botelho, João de Melo, Adelaide Freitas, Pedro da Silveira, Alfred Lewis e até o icónico Moby Dick, de Hermann Melville. Qual a importância, para si, como Director Editorial da grotta, prestar estas homenagens aos autores e obras?
É um intuito perseguido desde o início. A Grotta pretende situar-se entre a tradição e a experimentação, entre a atenção merecida a vozes afirmadas e a vontade de dar lugar a diferentes escritas e outras artes. Além dessas celebrações, chamemos-lhes assim, todas justificadas, existem muitas escritas, de penas muito diferentes, em formatos como o conto, o diário e a poesia. A dimensão de “homenagem” surge como vontade de dizer: há um passado literário que merece ser sublinhado. Nós damos o nosso contributo.
3. O subtítulo da revista grotta é arquipélago de escritores, nome também dado ao evento literário organizado pela Câmara Municipal de Ponta Delgada em Novembro do ano passado, com a sua curadoria. De que forma vê a dinâmica entre esses dois projectos?
Vejo como projectos dialogantes, claramente. Quer os Encontros quer a revista têm o mesmo objectivo: promover a leitura e a criatividade, convocando vozes diversas. O projecto Arquipélago de Escritores é ambicioso – não porque queira ser enorme, mas porque pretende estender-se, aos poucos, de diferentes maneiras e em diferentes formatos. Lutar pelo livro, pela leitura e pela escrita merece que se avance em várias frentes. Aos poucos pode ser que se consiga conquistar alguma coisa.
4. Muitas livrarias e escolas queixam-se de que os jovens não consomem muita literatura, principalmente a dita de qualidade. Como se poderia reverter esta situação? Em que medida eventos literários como o Arquipélago de Escritores poderão colmatar esta falha?
Um evento literário como o Arquipélago de Escritores tem uma dimensão informal, juntando leituras, concertos e visitas a escolas por parte de escritores, que pode ser cativante para as novas gerações. É a ideia de aproximar as pessoas da literatura, tirando-lhe uma solenidade que não merece. Isso consegue-se, por exemplo, com conversas informais sobre temas que não são especificamente literários, mas que partem dos livros.
5. No âmbito do lançamento deste novo número da revista grotta será também apresentada a próxima edição do evento Arquipélago de Escritores. O que nos poderá adiantar acerca do evento? Já sabe quem será o/a autor/a homenageado/a?
Não irei adiantar muito porque ainda é preciso desenhar a nova edição com calma. Tenho já uma ideia, sim, de quem poderá ser homenageado. É necessário amadurecê-la e trocar umas ideias com a minha equipa. E gostava muito de concluir um documentário sobre um escritor açoriano que já morreu – para ser exibido durante o Encontro. A partir de um lugar, no caso uma ilha, olhou o mundo e fez uso de uma linguagem muito sua.
6. O foco da revista grotta são os autores açorianos, mas não se limita a isso. Muitas são as participações de autores do continente e até do estrangeiro, além dos dossiês especiais, que no primeiro número foi dedicado à poesia irlandesa, o segundo à literatura de Porto Alegre (Brasil) e agora à poesia galega (Espanha). Quais são as razões para estas escolhas?
Estas escolhas têm a ver com a circunstância de querermos valorizar o diálogo com outras literaturas. Temos escolhido “territórios” com os quais achamos que os Açores têm afinidades. Lugares de fronteira, de emigração, nos quais a procura de uma identidade própria sempre foi valorizada, onde a escrita está ligada ao lugar. Os autores de diferentes proveniências que figuram na revista estão representados porque achamos que a escrita deles vale a pena, merece ser publicada e comentada.
7. Para além do dossiê sobre poesia galega o que os leitores poderão contar no terceiro número da revista grotta?
Esse é um gesto de desbravar caminho que caberá ao leitor. É o leitor que deverá perder-se nesta Grotta número 3. Posso garantir que há textos em géneros muito diferentes, uns com condimentos líricos, outros com condimentos humorísticos, outros ainda com condimentos reflexivos e ensaísticos. Até temos um pequeno texto para teatro – que acabou por não entrar na peça para o qual se destinava. Penso que o tema da identidade, central na literatura, atravessa muitas destas linguagens literárias.
8. Sabemos que ainda é muito cedo, mas já tem ideia dos conteúdos que estarão na próxima edição da revista?
É muito cedo mas já temos um texto. Chegou hoje. É um princípio. O que posso dizer é que vamos continuar a atirar-nos das rochas para o mar, como o fazem, com alegria e risco, os rapazes da foto de capa deste número 3.
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